Em 2008, os
Estados Unidos conheceram o candidato Barack Obama. Em 2012, os Estados Unidos
conhecem o presidente Barack Obama.
Foi uma
mudança significativa, que gerou dúvidas e desconfianças em diversos círculos
da sociedade americana, mas não grande o suficiente para impedir que o homem
que fez história no passado voltasse a reescrever neste 6 de novembro para
adquirir o direito de liderar os Estados Unidos até 2016.
Em 2008,
Obama era o candidato que apresentava o passado de superação da infância de
dificuldades em direção ao brilhantismo no Direito de Harvard e à explosão
antes dos 50 anos como senador e astro ascendente do Partido Democrata. Há
quatro anos, Obama, o negro nascido no Havaí com um Hussein como nome do meio,
simbolizava o americano que transcende raças e nações.
Tudo isso
ainda estava em jogo e contava a seu favor, mas, para manter-se no cargo, Obama
necessitava deixar sua biografia pessoal de lado e lidar com a presidencial.
Candidato da esperança desenfreada, do sonoro e coral "sim, nós
podemos", o Obama candidato de 2012 precisou afastar-se do idealismo em
direção ao realismo. E as promessas para seu proposto segundo mandato passaram
necessariamente pelo saldo das suas conquistas e de seus fracassos.
Discordâncias
Onde os
apoiadores de Obama veem vitórias, seus críticos veem derrotas. Esta
discordância, bastante comum e mesmo esperada em embates ideológicos -
sobretudo de uma sociedade politicamente marcada por uma ainda forte lógica
bipartidária -, possui basicamente duas versões, que muitas vezes se sobrepõem.
A primeira é uma discordância baseada na insatisfação com os resultados; a
segunda é uma discordância causada pela posse de premissas filosóficas
diferentes.
Pertencente
à primeira classe de discordância está, essencialmente, a política econômica.
Os números estão aí: os gastos federais aumentaram, a dívida federal cresceu, e
o desemprego exibe ainda um número expressivo. Os críticos de Obama enxergam
nisso um fracasso: acreditam que os gastos já deveriam ser menores e o
desemprego, sobretudo, ter sido extirpado. Os apoiadores do presidente veem
nisso, se não uma vitória, algo esperado: como disse Bill Clinton, "nenhum
presidente teria solucionado a economia que Obama encontrou".
Essa disputa
potencialmente interminável entre a satisfação e decepção com os resultados
econômicos da atual Casa Branca pertencem ao um nível muito real do debate da
sociedade americana: o emprego e o salário, entidades míticas da cultura do
país, importam a todos, e é de se esperar que haja discordâncias de graus sobre
até onde Obama foi poderia ter ido em quatro anos.
Mas a
discordância gradual sobre a economia de Obama, absolutamente central à
campanha dos republicanos, é seguida de temas marcados por discordâncias que
emergem das premissas radicalmente distintas filosóficas defendidas por
democratas e republicanos. Essas discordâncias, que permeiam a grande maioria
dos debates sobre a biografia presidencial de Obama, apontam, mais que tudo,
para que futuro os Estados Unidos querem e podem ter.
Diretamente
ligado à economia está Medicaid, programa que prevê a expansão da parcela da
população dotada de seguro de saúde. O projeto, votado e aprovado em 2009, foi
ratificado pela Suprema Corte em 2012. O Obamacare, como ficou conhecido,
obriga os menos abastados a contrair um seguro de saúde - dos quais muitas
vezes abrem mão por não ter dinheiro; o governo, em contrapartida, financia
grande parte dos custos.
Clássica
demanda dos democratas assumida com afinco pelo presidente, o programa é um dos
grandes trunfos de Obama. Para os republicanos, trata-se de um programa visto
com vistas tortas, pois aumenta os gastos federais e interfere na liberdade das
pessoas - duas bandeiras caríssimas ao Grand Old Party.
Bandeiras
democratas
Na esteira
das questões diretamente ligadas à economia, Obama ostenta uma biografia
marcada pela inclusão.
Militou
contra a política do "Don't ask, don't tell" ("Não pergunte, não
conte"), que proibia que se procurasse descobrir a orientação sexual dos
oficiais militares e, na prática, restringia a existência militares
homossexuais. Contra os conservadores religiosos, batalhou a favor da liberação
da pesquisa de células-tronco. Colocou-se, também contra esses grupos, a favor
da ampliação do direito ao aborto em casos de gravidez indesejada ou causada
por estupro.
E, na
contracorrente dos políticos de tendência xenófobos, sua administração foi
marcada por uma maior tolerância com os imigrantes legais e ilegais dos Estados
Unidos (neste âmbito, sua última ação, vista pelos republicanos como
eleitoreira, foi flexibilizar o direito ao trabalho a jovens imigrantes
ilegais).
Por fim, a
política externa de Obama foi marcada, nestes quatro anos, principalmente pela
tolerância e pelo o diálogo. Gerando críticas e ódios entre os republicanos,
sempre evitou enfrentamentos diretos com outras nações, seja em conflitos mais
diplomáticos (Rússia) ou econômicos (China) como no mais propriamente políticos
(Irã) e belicosos (Síria). Cumprindo com o compromisso de campanha, reduziu e
retirou todas as tropas no Iraque, invadido em 2003 durante a administração
George W. Bush.
Multidão
comemora vitória de Obama diante da Casa Branca
Essa postura
contrária ao imperialismo não impediu, no entanto, que Obama aumentasse as
tropas no Afeganistão - entendendo se tratar de um conflito complexo que exigia
maior participação internacional - e mesmo mandasse tropas para o Paquistão
para capturar (e matar) Osama bin Laden. Ele também falhou ao não conseguir o
apoio necessário para fechar a Baía de Guantánamo, criada em Cuba para prender
e julgar os acusados de terrorismo.
E, em um dos
poucos momentos em que recebeu críticas da comunidade internacional como um
todo, negou o pedido palestino da incorporação como membro pleno da Organização
das Nações Unidas (o ato mostrava o quanto Obama, ainda que um militante
democrata, se encontra atrelado ao lobby israelense, tão caro aos
republicanos).
O futuro e a
mudança
Obama, tal
qual os republicanos, acredita que os Estados Unidos são o melhor país do
planeta; no entanto, acredita que o século XXI apresenta uma estrutura
política, econômica, social e ideológica diferente da predecessora, o que, por
consequência, exige uma nova postura dos Estados Unidos. Trata-se de uma visão
complexa, ainda em formação, e com a qual muitos americanos não se sentem à
vontade.
"Eu
mudei", disse Obama ao aceitar a nomeação na Convenção Nacional do Partido
Democrata desde ano, realizada em Charlotte, na Carolina do Norte. "O
caminho que oferecemos pode ser mais difícil, mas leva a um lugar melhor. E eu
peço que vocês escolham este futuro", convocou, deixando um pouco de lado
o sonho do idealismo a apostando no esforço do realismo.
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