Jornalista da Rede Globo participará do II Seminário de
Jornalismo e Mídia Training do Oeste do Pará, em Santarém, nos dias 23 e 24
deste mês
Imagem Globo News
No II Seminário de Jornalismo e de Mídia Training do Oeste do
Pará você vai falar sobre Ética e Jornalismo – Fronteiras da Cidadania. Como
aplicar a ética jornalística no noticiário político tão adverso de Brasília?
Cristina Serra: Antes de qualquer coisa, a ética está dentro
de cada um de nós, como pessoas e profissionais. Se você me perguntar sobre o
código de ética jornalística, nem saberia te dizer o que consta em todos os
artigos. É claro que já o li e o estudei na faculdade, mas digo que não preciso
tê-lo de memória porque a ética – que procuro aplicar em tudo na vida e não
apenas no trabalho – se baseia em princípios simples: procurar a verdade,
sempre; ouvir todos os lados envolvidos, dar voz a todos; ter uma relação
transparente com as fontes e com os entrevistados; acima de tudo ter
compromisso com o público. A credibilidade é o maior patrimônio de um
jornalista e só é possível conquistá-la agindo de forma ética. Isso vale para
qualquer lugar ou setor que você cubra. Em Brasília, a dificuldade a mais
talvez seja separar, claramente, o joio do trigo; saber – em cada reportagem –
quais os interesses em jogo, distingui-los e publicar aquilo que, de fato, é
relevante para o público. Sempre que vou fazer uma reportagem, a primeira
pergunta que me faço é: qual o interesse do cidadão neste assunto? Tudo o mais
vai decorrer dessa resposta.
Nos últimos anos muito se discutiu sobre a obrigatoriedade ou
não do diploma de jornalista para exercer a profissão. Qual a sua opinião sobre
esse assunto?
Cristina Serra: Acho que todo profissional de jornalismo deve
ter um diploma universitário, que pode ser de jornalismo ou outra profissão.
Mas tem que ter nível superior. A exigência do diploma foi uma grande
conquista, que não pode ser perdida. Qualificou e profissionalizou o exercício
do jornalismo, conscientizou as redações. Mas, acho que a contribuição de
outros profissionais enriqueceria as redações. Quanto mais plural, mais rico o
Jornalismo. Ainda mais hoje em dia, com a tecnologia da informação tão acessível
a tanta gente, não vejo muito sentido em restringir. Acho que o caminho é
ampliar, mas com organização e regras. Um caminho para os profissionais de
outras áreas que quisessem atuar sistematicamente como jornalistas seria,
talvez, fazer uma especialização de um ou dois anos para se preparar para as
particularidades da profissão e obter o registro.
Como você avalia a
formação do jovem jornalista atualmente? A Universidade/Faculdade tem cumprido
o papel na formação dos novos profissionais?
Cristina Serra: Estou distante das universidades. Posso falar
apenas pelos estagiários que passam pela TV Globo e por um ou outro contato que
faço com estudantes por meio de palestras. Me parece que os estudantes, hoje,
estão mais preparados, não sei se porque as faculdades melhoraram ou porque,
hoje, eles recebem uma avalanche de informações e porque fazem parte de uma
geração super conectada, o que não acontecia na minha época, 30 anos atrás
(risos). Outro exemplo interessante são os jovens jornalistas que trabalham no
Profissão Repórter, do Caco Barcellos, alguns excelentes! Estamos falando, no
entanto, de estudantes de grandes centros e universidades que já tem tradição
no ensino de jornalismo. Certamente, deve haver um desnível muito grande entre
os cursos Brasil afora.
Você é especializada em política, trabalha com esta editoria
desde a década de 1980 e há alguns anos sua sede é Brasília. Como é cobrir a
política no Centro Político do país? Quais os episódios/coberturas políticas
mais marcantes nesses anos?
Cristina Serra: Realmente, eu adoro política. Desde a
faculdade, me interessei e direcionei meu trabalho pra isso. Trabalhei um
período no Rio de Janeiro, já cobrindo política local, e vim pra Brasília
porque queria me aprofundar no assunto. Cobrir política é como ser testemunha
da História o tempo todo, é um privilégio e uma grande responsabilidade. É como
andar em campo minado porque sempre há muitos interesses em jogo e é preciso
distingui-los para não ser instrumento de nenhum setor, de nenhum lobby, de
nenhum partido. É um desafio. Quanto mais trabalho, mais aprendo. Aliás, essa é
uma das grandes belezas do jornalismo: ter a humildade de aprender todo dia uma
coisa nova. Em política, então, isso é ainda mais verdadeiro. Cada novo grupo
que chega ao poder, você começa tudo de novo. Mudam as fontes, a forma de
agirem, os códigos do poder, entende? E a gente tem que aprender tudo de novo.
Coberturas marcantes? Sempre acho que será a próxima. Gosto de olhar pra
frente. Mas, pra não deixar você sem resposta, uma que me marcou muito – talvez
porque ainda era uma menina e porque foi o começo de uma grande transformação
no Brasil – foi a cobertura das manifestações populares pelas eleições diretas,
em 84/85, no Rio. Eu era estagiária do jornal Tribuna da Imprensa e fui
destacada para isso. Escrevia matérias de página inteira, uma delícia, eu,
saindo da fralda, e escrevendo sobre Tancredo, Ulysses, Brizola, Covas, Lula
etc. (risos). O famoso comício da Candelária é inesquecível. Outra cobertura
importante pra mim foi a campanha a presidente do Brizola, em 89. Viajei por
vários lugares do Brasil cobrindo a campanha dele. Brizola é um grande
personagem e era muito divertido também. Nesse caso, eu já estava no Jornal do
Brasil. Como ele não foi para o segundo turno, passei a reforçar a equipe de
cobertura do Collor e – modéstia a parte – fiz uma das matérias mais
importantes daquela cobertura. Escrevi a primeira matéria revelando o
personagem PC Farias, tesoureiro da campanha e, naquela altura, já envolvido em
falcatruas e investigado pelo Banco Central. A matéria fez algum barulho, mas
Collor acabou sendo eleito e depois, deu no que deu. Quando vim para Brasília,
uma cobertura muito importante, já na TV, foi o período das reformas do
primeiro mandato do governo FHC. Foi um momento de discussão muito rico sobre o
Brasil que queríamos construir a partir dali – uma discussão, aliás, inconclusa
porque foram feitas algumas reformas, mas outras ficaram pelo caminho. No
governo Lula, teve a cobertura da CPI dos Bingos, que redundou no chamado
escândalo do Caseiro e na demissão do ministro da Fazenda, Antônio Palocci. E
agora, pra ficar num assunto bem atual, destaco a cobertura do julgamento do
Mensalão, a cobertura dos sonhos de qualquer jornalista que gosta de política.
Estou “pinto no lixo” (risos).
Você foi correspondente em Nova York e fez inúmeras
reportagens internacionais, foi à Antártida, onde visitou a base chilena e a
base brasileira de pesquisa e conversou com cientistas brasileiros; foi enviada
especial pós-terremoto no Haiti. De que forma essas coberturas foram
importantes pra sua carreira? Que outra cobertura internacional você
destacaria?
Cristina Serra: A cobertura internacional enriquece muito o
jornalista, abre os olhos e a cabeça pro mundo. Nesse sentido, os três anos que
passei em Nova York foram sensacionais, é uma experiência que vou levar pra
vida toda. É muito importante ver como a imprensa trabalha num país que já tem
suas instituições democráticas consolidadas. Lá, a imprensa é muito respeitada
e você percebe que a sociedade como um todo valoriza o trabalho do jornalista,
como um elemento essencial para o funcionamento da democracia. A sociedade
americana valoriza e cobra transparência das autoridades e o público vê o
jornalista como esse canal entre a sociedade e o poder, as autoridades. Acho
que esse foi o maior aprendizado que eu trouxe de lá. Tive outras experiências
internacionais, como a cobertura das discussões, na ONU, sobre a guerra no
Iraque; a reeleição do Bush, em 2004; a Antártica, o Haiti, a prisão da
fraudadora Jorgina de Freitas, na Costa Rica, em 97/98, várias viagens
internacionais do FHC e do Lula; fiz uma série em Cuba para o Fantástico,
enfim, já fui a quase todos os continentes a trabalho. Isso é importante, um
jornalista precisa botar o pé na estrada. Então, adoro as coberturas
internacionais, mas meu maior interesse como jornalista, minha grande paixão é
o Brasil. Temos muito que fazer aqui. O Brasil é uma nação em construção e
acredito que o jornalismo tem sua contribuição a dar.
Com toda essa experiência a pergunta que não quer calar é:
Vem um livro por aí? Os estudantes de jornalismo agradecem!
Cristina Serra: Tenho várias idéias para um livro. Mas, cadê
tempo???? A vida de repórter absorve demais. Mal consigo me dividir entre o
trabalho e a família. Um livro está no horizonte, sim, mas acho que vou ter que
esperar a aposentadoria (risos).
Fonte: RG 15/O Impacto e Agência
Podium
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